Sunday, September 27, 2009

Ação negra por um novo mundo possível - 1



É já um tempo demasiado longo este em que as diferenças são submetidas à opressão, à negação, à exclusão, à discriminação, à hipocrisia, ao descaso. Uma condição absolutamente injusta. Iníqua.

É hora, já, de lutarmos todos pela superação deste tempo.

É urgente a luta de homens e mulheres que emancipe de fato as diferenças, que instaure a igualdade de direitos, que inaugure as necessárias relações solidárias, fundamentos da construção de um mundo novo possível.

A sociedade que dá fim à exploração do trabalho e põe os frutos da produção coletiva à mesa de todos os produtores só pode ser finalmente conquistada com a destruição do capitalismo. E esta condição requer o reconhecimento, hoje, da igualdade de direitos entre todos os seres humanos.

É a luta pela conquista da igualdade de direitos e oportunidades que informa de maneira consistente e consciente o combate contra a sociedade de classes imposta pela dominação capitalista.

Em nosso país, o modo de produção escravista realizado por mais de três séculos deitou fundas as raízes da iniqüidade em toda as relações sociais formadoras da nacionalidade. Elas ainda hoje permeiam o conjunto da vida social brasileira como se revela no retrato trágico da exclusão pela discriminação racial.

A exploração do trabalho de milhões de seres humanos aprisionados em África
[chamados escravos pelos traficantes e proprietários, de negros pela elite colonial e européia, de gentios pela ideologia dominante que lhes permitia a escravização do semelhante e a ele outorgava a condição de mercadoria ou mão-de-obra]
ergueu fortunas, riquezas, países, impérios, na América e na Europa.

Aqui foi concedida alforria aos senhores, desobrigados da manutenção da posse e da indenização devida a trabalhadores e a todas as gerações escravizadas da etnia vilipendiada.

A farsa colonialista da Abolição aprisionou nas faldas e sopés de morros, nas matas, nos grotões e beiras de estrada a multidão expulsa sem meios das lavouras e minas. Sem mais ferros, chicotes e senzala, agora à mercê do modo de exploração do trabalho no processo de industrialização ainda incipiente.

Ao imigrante branco, o império deu a terra. Produzida a subsistência, a renda restante começaria a alavancar aqui o processo mercantil necessário à produção fabril inglesa de matriz ou filial...
[ou francesa, ou alemã, ou belga...]

O novo modo de reproduzir a existência submeteu de forma cruel homens e mulheres africanos ou afrodescendentes, crianças, jovens ou velhos.

Nenhuma reparação, sem qualquer indenização. Sem chão, sem casa, sem posto de trabalho [nem eira ou beira].

A modernidade só vai encontrar o Brasil tardiamente, já no limiar do século 20.

O novo milênio, inaugurado pelo século 21, é um tempo de necessárias e urgentes definições.

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A hora exige radical defesa das liberdades públicas, do respeito à diferença e da igualdade de direitos.

Na teoria e na ação, no Brasil e no Mundo.

É por esta razão o nosso compromisso com o combate ao racismo, pelas reparações com ocupação democrática do território, pela extinção da sociedade de classes.

...

A globalização constitui-se em uma estratégia de acumulação que, operada a partir destes governos "nacionais", impôs a eliminação de todos os meios de proteção do trabalho e do desenvolvimento das economias nacionais.

Produziu a transformação dos valores culturais, ideológicos e econômicos a partir destes oligopólios.

A conseqüência é a dilapidação do mercado nacional e desestruturação do sistema produtivo de cada país, a aniquilação das culturas locais, a sonegação dos direitos, corroendo progressivamente as bases de um conceito de nação.

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A estrutura política reflete este caráter antidemocrático das elites locais. Ainda que formalmente republicana, federativa e democrática, a organização política brasileira é extremamente patrimonialista, centralizada e autoritária.

Somente a unidade popular poderá quebrar esta história.

...

O modo de proceder do indivíduo antecede à existência da coletividade, eis que a coletividade resulta de indivíduos que se orientam pelos mesmos objetivos, idéias e práticas.

Nosso pressuposto é conquistar o regramento das ações do indivíduo para que este faça crescer a coletividade e não o individualismo, a arrogância, a prepotência, a intolerância, o centralismo e o personalismo.

O respeito ao conhecimento e à produção coletivas significam que o projeto não pertence a um indivíduo, mas sim à coletividade.

É fundamental a constituição de referências permanentes que articulem as lutas populares, partidárias, institucionais e culturais, que integrem a militância social e militâncias partidárias.

Nossa ação nos espaços que ocupamos deve realizar a conversão das teses para a vida, superando os limites burocráticos, implementando políticas que façam, de fato, avançarmos no nosso projeto, emancipando os trabalhadores, superando a discriminação, fortalecendo os movimentos, combinando tese e prática, discurso e fazer cotidiano e ação institucional.

Assim, nós, cada um, constituiremos os parâmetros que balizem ações permanentes, que prefigurem no presente a sociedade nova do mundo que queremos revolucionado pelas idéias de reparação,
fim da iniqüidade, igualdade de oportunidade e direitos...

(trechos do artigo Ação negra por um novo mundo possível, iniciado em 2000, em desenvolvimento)

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