Saturday, February 27, 2010

Belo Monte: a volta triunfante da ditadura militar?

Leonardo Boff*

O Governo Lula possui méritos inegáveis na questão social. Mas na questão ambiental é de uma inconsciência e de um atraso palmar. Ao analisar o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) temos a impressão de sermos devolvidos ao século XIX. É a mesma mentalidade que vê a natureza como mera reserva de recursos, base para alavancar projetos faraônicos, levados avante a ferro e fogo, dentro de um modelo de crescimento ultrapassado que favorece as grandes empresas à custa da depredação da natureza e da criação de muita pobreza. Este modelo está sendo questionado no mundo inteiro por desestabilizar o planeta Terra como um todo e mesmo assim é assumido pelo PAC sem qualquer escrúpulo. A discussão com as populações afetadas e com a sociedade foi pífia.

Impera a lógica autoritária; primeiro decide-se depois se convoca a audiência pública. Pois é exatamente isto que está ocorrendo com o projeto da construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte no rio Xingu no Estado do Pará.

Tudo está sendo levado aos trambolhões, atropelando processos, ocultando o importante parecer 114/09 de dezembro de 2009, emitido pelo IBAMA (órgão que cuida das questões ambientais) contrário à construção da usina, a opinião da maioria dos ambientalistas nacionais e internacionais que dizem ser este projeto um grave equívoco com consequências ambientais imprevisíveis.

O Ministério Público Federal que encaminhou processos de embargo, eventualmente levando a questão a foros internacionais, sofreu coação da Advocacia Geral da União (AGU), com o apoio público do Presidente, de processar os procuradores e promotores destas ações por abuso de poder.

Esse projeto vem da ditadura militar dos anos 70. Sob pressão dos indígenas apoiados pelo cantor Sting em parceria com o cacique Raoni foi engavetado em 1989. Agora, com a licença prévia concedida no dia 1º de fevereiro, o projeto da ditadura pôde voltar triunfalmente, apresentado pelo Governo como a maior obra do PAC.

Neste projeto tudo é megalômano: inundação de 51.600 ha de floresta, com um espelho dágua de 516 km2, desvio do rio com a construção de dois canais de 500m de largura e 30 km de comprimento, deixando 100 km de leito seco, submergindo a parte mais bela do Xingu, a Volta Grande e um terço de Altamira, com um custo entre 17 e 30 bilhões de reais, desalojando cerca de 20 mil pessoas e atraindo para as obras cerca de 80 mil trabalhadores para produzir 11.233 MW de energia no tempo das cheias (4 meses) e somente 4 mil MW no resto do ano, para por fim, transportá-la até 5 mil km de distância.

Esse gigantismo, típico de mentes tecnocráticas, beira a insensatez, pois, dada a crise ambiental global, todos recomendam obras menores, valorizando matrizes energéticas alternativas, baseadas na água, no vento, no sol e na biomassa. E tudo isso nós temos em abundância. Considerando as opiniões dos especialistas podemos dizer: a usina hidrelétrica de Monte Belo é tecnicamente desaconselhável, exageradamente cara, ecologicamente desastrosa, socialmente perversa, perturbadora da floresta amazônica e uma grave agressão ao sistema-Terra.

Este projeto se caracteriza pelo desrespeito: às dezenas de etnias indígenas que lá vivem há milhares de anos e que sequer foram ouvidas; desrespeito à floresta amazônica cuja vocação não é produzir energia elétrica mas bens e serviços naturais de grande valor econômico; desrespeito aos técnicos do IBAMA e a outras autoridades científicas contrárias a esse empreendimento; desrespeito à consciência ecológica que devido às ameaças que pesam sobre o sistema da vida, pedem extremo cuidado com as florestas; desrespeito ao Bem Comum da Terra e da Humanidade, a nova centralidade das políticas mundiais.

Se houvesse um Tribunal Mundial de Crimes contra a Terra, como está sendo projetado por um grupo altamente qualificado que estuda a reinvenção da ONU sob a coordenação de Miguel dEscoto, ex-Presidente da Assembléia (2008-2009) seguramente os promotores da hidrelétrica Monte Santo estariam na mira deste tribunal.

Ainda há tempo de frear a construção desta monstruosidade, porque há alternativas melhores. Não queremos que se realizem as palavras do bispo Dom Erwin Kräutler, defensor dos indígenas e contra Belo Monte: "Lula entrará na história como o grande depredador da Amazônia e o coveiro dos povos indígenas e ribeirinhos do Xingu".

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Leonardo Boff é representante e co-redator da Carta da Terra.

ONGs lançam nova ofensiva contra hidrelétricas do Madeira
01 July, 2008 21:29

Nilder Costa
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26/jun/08 (Alerta em Rede) – A relativa celeridade com que os processo de licenciamento ambiental das hidrelétricas do Complexo do Rio Madeira – Santo Antônio e Jirau (6.300 MW) – vêm ocorrendo tem deixado o aparato ambientalista a reboque dos acontecimentos. Inversamente ao que ocorreu com o projeto da hidrelétrica de Belo Monte, onde tiveram a iniciativa, as ONGs foram literalmente atropeladas com a determinação política do governo em tocar o Complexo do Madeira e contra o qual produzem, de forma reativa, documentos e manifestações que têm se mostrado inócuos.

A mais recente reação espasmódica do aparato contra o Complexo veio com um duplo ataque da Amigos da Terra ( Friends of the Earth) e sua irmã menos conhecida, a International Rivers Network (IRN), sob a forma de um livro ("Águas Turvas: alertas sobre as conseqüências de barrar o maior afluente do Amazonas") e um relatório contestando o Projeto Básico Ambiental apresentado pela Madeira Energia S.A., consórcio formado pelas empresas Odebrecht e Furnas, vencedor da concessão de Santo Antônio.

O coordenador visível de ambos é Glenn Switkes, que comanda as ações da IRN no Brasil, e apresentam os questionamentos usuais sobre a ‘viabilidade socioambiental’ dos empreendimentos. [1]

As críticas ao Projeto Básico Ambiental se resumem ao seu nível de detalhes que foi considerado "insuficiente" pela autora do libelo, a consultora Leanne Farrell, que trabalhou em ONGs em Washington e no Departamento de Salvaguardas para América Latina do Banco Mundial. [2]

Sergio França Leão, diretor de meio ambiente da Odebrecht, rebateu todas as críticas. Ele diz, por exemplo, que a legislação brasileira estabelece que a área de preservação em volta dos reservatórios tem que ter largura mínima de 30 metros em zonas urbanas e de 100 metros em zonas rurais, e que no Código Florestal a área depende da largura do rio, podendo alcançar 500 metros, conforme o pedido do Ibama neste caso. "Acontece que a região do Madeira é ocupada por ribeirinhos cuja vida depende da proximidade do rio. Ali tem gente, tem cultura, tem história. Não se pode tirar tudo com uma régua de 500 metros. A idéia é remover as pessoas quando há impactos ambientais, mas o pessoal esquece que existe gente ali. É preciso analisar o retrato desta paisagem com mais atenção, para que se possa tratar de coisas desiguais de jeito diferente", disse Leão. Na proposta mais flexível da empresa, sairiam 700 famílias, ou umas 3 mil pessoas. "Evidentemente tudo isso tem que passar pelo crivo do Ibama."

Sobre os prazos de monitoramento, outro item questionado, Leão diz que os programas continuam, mas que têm que ser revistos, por isso as datas de 5 a 7 anos: "Tanto é que a licença de operação não é indefinida, ela também tem que ser renovada a cada 5 anos".

O que mais chama a atenção nesses ataques do aparato ao Complexo são os seus patrocinadores, as milionárias fundações ‘filantrópicas’ do eixo anglo-americano: Fundação Ford, Fundação Gordon e Betty Moore, Fundação Kendeda, Fundo Blue Moon. Todas elas muito interessadas em ‘proteger’ a Amazônia.

Veja-se que a International Rivers Network tem um orçamento anual que gira em torno de 1,8 milhão de dólares que são ‘doados’, em quase sua totalidade, pelas seguintes entidades: [3]


Aveda Corporation
The Ford Foundation
Global Environment Project Institute
GTZ (governo alemão)
Heinrich Böll Foundation (vinculado ao Partido Verde alemão)
Kendeda Fund
The Libra Foundation
The George and Miriam Martin Foundation
The McKnight Foundation
Steve J. Miller Foundation
Moriah Fund
Charles Stewart Mott Foundation
Open Society Institute (do megaespeculador George Soros)
Oxfam America
Oxfam Australia
Oxfam Great Britain
The Sigrid Rausing Trust
Swedish Society for Nature Conservation
Tides Foundation
Wallace Global Fund
The Walton Family Foundation
Weeden Foundation


Outrossim, tanto a Amigos da Terra como a International Rivers Network foram fundadas por David Brower, falecido em 2000 e considerado um dos mais radicais ambientalistas do eixo anglo-americano.

Resulta que essas ONGs estão promovendo mesmo são os interesses geopolíticos de seus patrocinadores que quase nunca coincidem com os do Brasil.



Notas:
[1]Ambientalistas lançam livro sobre as hidrelétricas do Madeira, Amazonia.org.br, 25/06/2008
[2]ONGs questionam projeto de hidrelétrica, Valor, 26/06/2008
[3]Annual Report 2006, IRN, agosto/2007

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